A Nana , Mariana de seu nome, conheceu-me antes de eu própria me conhecer a mim ou a Porto Covo, terra que a viu nascer.
A segunda mais velha de dez irmãos, filha de pescadores, vivia numa casa que eu, ainda muito miúda, chamava a casa do papão: era uma casa de terra batita, onde os "quartos" tinham como separação uns dos outros lençóis brancos pendurados em cordas.
Como era das mais velhas, foi muito nova tomar conta de uma avó cega, porque a mãe só gostava dos filhos homens.
Quando eu nasci, a Nana veio para casa dos meus pais "servir", e ajudar a minha mãe. Os meus pais incentivaram-na a estudar, tirou o curso de enfermagem e depois de psicologia. Trabalhou no IPO, chefiou uma creche, até que resolveu já depois de reformada ir viver para Porto Covo, e comprar esta casa mesmo em cima da baía.
De vez em quando, quando eu passava, lá estava ela a regar as flores, a dar de comer aos gatos e aos cães, e ela carinhosamente dizia: Então Nani, como está? E as meninas? Neste verão pude dizer-lhe que já tinha um neto, o Guilherme. Que bom, disse ela.
E sempre com o sorriso de muito carinho que eu sei que sempre teve por mim.
Um destes dias qualquer coisa me fez desenhar a casa. Sentada nas pedras do porto de abrigo, ao fim do dia, uma temperatura tão boa, uma luz tão bonita do entardecer. Estranhei não ver nem ouvir cães ou gatos, estava tudo fechado. Pensei, talvez tenha ido a Lisboa ao médico.
Vim a saber que nesse dia fazia um mês que tinha falecido.
Por vezes é difícil sabermos porque decidimos desenhar, o que nos motiva, o que nos faz querer parar o tempo. Até porque eu acredito que desenhar pode ser uma forma de amor.
Nana, sinto saudades suas...